Retrospectiva

Quando o passado foi Futuro

 

 

A segunda metade dos anos 80 viu surgir um conjunto de primeiras obras de vários cineastas portugueses. Muitos deles – quase todos – passaram pela Escola de Cinema e tiveram a geração do Novo Cinema como professores ou como referências estéticas. Contudo, esta nova geração fugiu, em muitos aspectos, às coordenadas essenciais do cinema português de então: a ressaca do cinema militante do pós 25 de Abril e da designada “Escola Portuguesa”. Os filmes apresentam novas temáticas, novos actores e colaboradores, banda sonoras repletas de novas sonoridades rock, novas visões do mundo e um espírito cinéfilo mais heterodoxo. Muitos destes filmes não chegaram sequer a estrear e permanecem ignorados, alguns dos seus autores não prosseguiram uma carreira na realização, mas este conjunto de filmes iniciou uma viragem no cinema português.

Urge (re)ver esses filmes e ouvir os seus protagonistas. O objectivo desta retrospectiva é precisamente exibir os filmes e dar a palavras aos seus realizadores, mais de duas décadas depois da sua produção.

 

Dia 14 – Segunda-feira
15h – TAGV

O Bobo | José Álvaro Morais | 1987 | 123′

Programação Alterada

Sinopse –
Lisboa, 1978. Os últimos dias de ensaio duma tentativa de adaptação teatral, no velho estúdio da Lisboa Filme, do romance “O Bobo” de Alexandre Herculano, pelo encenador Francisco Bernardes, que também desempenha Dom Bibas. Articulação de peripécias actuais com elementos do passado – fundação da nacionalidade, queda do império – através de intrigas políticas, enredos amorosos. A vida dos intérpretes no quotidiano. Francisco é confrontado pela antiga afeição com uma actriz, Rita Portugal, e retoma um pacto quanto a João, um amigo com armas para vender.

Produzido entre 1979 e 1897, O Bobo é a primeira longa metragem de José Álvaro Morais, realizador de uma meia-geração de cineastas, ou uma “geração de intervalo”, que se emancipou na década de 80 e que promoveu uma renovação no cinema português. Influenciado pela obras que fizeram o novo cinema português e a escola portuguesa, O Bobo é um estimulante e complexo jogo de narrativas que, simbolicamente, assinala uma transição entre duas formas de cinema autoral português. Trata-se de um filme injustamente esquecido que aborda questões de fronteira entre ficção, auto-ficção e realidade e que reflecte sobre a identidade portuguesa e sobre o próprio cinema português.

Dia 15 – Terça-feira
15h – TAGV

Duma Vez Por Todas | 1987 | Joaquim Leitão | 100’


Sinopse –

Luis é um jovem aborrecido com a vida que leva. Está farto dos seus amigos, não gosta das mulheres com quem sai, não sabe o que há-de fazer à noite. Mas no prédio em frente há uma nova vizinha, uma mulher fascinante, com as noites muito, muito ocupadas. Luis começa a espiá-la mas não percebe o seu comportamento. Ela parece empenhada numa espécie de jogo com os homens que a rodeiam. Um deles, um piloto brasileiro, está envolvido num tráfico perigoso. Luis, cada vez mais obcecado por aquela mulher, acaba também por se envolver no tráfico. Mas ele não compreende o que se passa à sua volta, tudo lhe parece um jogo de regras difusas. Para alguns o jogo vai ser mortal.

Primeira longa-metragem de Joaquim Leitão, Duma vez por todas é um filme muito marcado pela cinefilia do ‘film noir’. Filme raro na cinematografia portuguesa dos anos 80, pretendia explorar novos caminhos pouco valorizados até então e afirmar uma cultura inconformista underground lisboeta que se expressava através de novos estilos musicais como o pop-rock e o punk, e que denunciava uma existência noctívaga e interrogava de forma pessimista o futuro. É um filme que quer ser de ruptura, sobretudo no seu modo de relacionamento com o público, em relação ao cinema português de então.


Dia 16 – Quarta-feira
15h – TAGV

O Sangue | Pedro Costa | 1989 | 95′
Programação Alterada

Sinopse –
Dois irmãos lutam pela sobrevivência e as muitas ausência do seu pai. Um dia, este morre, em circunstância misteriosas. Vicente e Nino partilham momentos de liberdade com Clara, que mantém uma relação com Vicente. Parecem formar uma nova família, perfeita. No entanto, essa liberdade é, quase de imediato, posta em causa por um grupo de homens que exige dos irmãos o pagamento de uma dívida do seu pai. Numa cidade de província vivem-se os gloriosos finais dos anos 80, entre a música pop portuguesa e o advento de um futuro europeu.

Primeira longa-metragem de Pedro Costa, O Sangue é um filme misterioso, filmado num magnífico preto e branco e que mantém uma relação narrativa forte com o cinema clássico americano. É um filme de um tempo: quer tematicamente (o confronto de gerações e sobrevivência de jovens protagonistas); quer na própria filmografia de Pedro Costa (nunca mais o realizador filmaria uma narrativa tão clássica e com elementos tão específicos como a inclusão de uma banda sonora). É também a revelação entusiástica de um olhar: desde o primeiro plano sabemos que o cinema português estava a ser abalado por um dos grandes cineastas do cinema contemporâneo. Por último, O Sangue é um filme paradigma na revelação de dois grandes actores: Pedro Hestnes e Inês de Medeiros.

 

 

17h – TAGV
Mesa Redonda
‘Quando o passado foi Futuro’